“Com a fotografia pude navegar e criar realidades que não eram tão sufocantes, pude interagir com pessoas com mais empatia e com as quais pude trocar e compartilhar experiências e acredito que isso seja muito poderoso.”
TP: Você se recorda da primeira fotografia que tirou? Ou, alternativamente, você poderia descrever a primeira fotografia tirada por você que solidificou seu amor pelo trabalho?
D: Eu não tenho uma memória clara da primeira fotografia que tirei quando era criança eu costumava brincar bastante com a cybershot dos meus pais (nasci em 1998). O que para mim torna um pouco divertido o fato de que anos depois eu trabalharia com fotografia analógica. Conforme fui crescendo, não me aventurei muito dentro do ramo. porque eu não possuía os fundos para adquirir uma câmera digital não tinha ideia do funcionamento de câmeras analógicas ou de como acessá-las. finalmente em 2018 eu e uma de minhas melhores amigas fizemos uma viagem juntas, ela estava estudando fora do país e eu senti que tirar fotos apenas com meu telefone não seria suficiente, então comprei minha primeira câmera analógica (uma Canonet QL-19),.a época a fotografia analógica estava tendo seu “revival”, pelo menos dentro da minha bolha, e não parecia mais tão inatingível. Foi durante a viagem que percebi que capturar o mundo daquela forma e por meio do material analógico era algo que me trazia alegria, desde então não pude parar!

Acima é possível observar a primeira fotografia feita por mim que ressoou com o que eu gostaria de passar, está um pouco queimada e fora de foco, mas é meu primeiro trabalho o qual até hoje posso dizer que estou orgulhosa. É uma pequena casa abandonada em Münster, Alemanha, até hoje posso dizer que sou cativada pela maneira como a natureza se incorporou à casa.
TP: Você poderia falar um pouco sobre fotografia de retrato? E o que significa para você ser capaz de capturar outras pessoas em momentos mágicos/delicados, especialmente em filme!
D: Então, no início eu era muito avessa a respeito de começar a fotografar retratos, sempre tive dificuldades de socialização e não sabia se eu seria capaz de dirigir os modelos e fazê-los se sentir confortáveis com a presença da câmera (e a minha), as quais eram minhas maiores preocupações na época. Me ative à fotografia de paisagem e de rua por cerca de um ano e meio até começar fotografar retratos.
Surpreendentemente o processo da fotografia de retratos aconteceu de forma bastante orgânica, inicialmente amigos próximos pediam para que eu tirasse fotos deles, então o fiz e tirei daquela experiência como um teste para ver se eu e meus sujeitos podíamos criar um trabalho significativo em conjunto e se minha insegurança estava entrando tanto no meu caminho como eu senti que estava.
Desde então sou completamente apaixonada sobre trabalhar com pessoas e construir histórias com elas através de retratos, acredito que trabalhar com filme têm sido um grande catalisador da minha criatividade, porque é necessário fazer cada fotografia contar, de forma que não experienciei quando tive a oportunidade de trabalhar com fotografia digital, então há muita reflexão e trabalho colocado em uma única imagem, desde o filme que irei usar até a cena fotografada.
Atualmente sou capaz de atuar como fotógrafa de retratos e acho incrível o modo como pessoas que não me conhecem ativamente desejam trabalhar comigo!
TP: Nos guie pela sua jornada como artista, você sempre soube que seria uma fotógrafa?
D: Honestamente, o pensamento não havia sequer me ocorrido antes de eu começar a tirar fotos.
Eu nasci em uma família tradicional no interior, o que por si só traduz em uma bagagem emocional diferenciada. Em 2016 comecei a estudar medicina na região metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, na época senti que estava fazendo o que era esperado de mim, além disso, aos 17 anos eu não tinha a menor ideia do que eu buscava em minha vida, então uma carreira médica não era algo com que eu estava confortável em negar tão rapidamente.
Durante o curso não posso dizer que fui feliz, a maioria das aulas não me satisfazia (de fato, eu reprovei em diversas delas), foi muito difícil encontrar pessoas com experiências e visão de mundo condizentes com as minhas, então tive poucas relações significativas. Sendo sincera, acredito que aquele ambiente era incrivelmente limitado, politicamente raso e não era capaz de prover muitas experiências positivas para pessoas que não conformam com perspectivas heterossexistas, logo, para mim foi muito difícil navegar aquela realidade.
Obviamente, minha saúde mental sofreu naquele período e o único lugar o qual eu recebia feedback positivo a respeito do que eu fazia era quando estava fotografando. Com a fotografia pude navegar e criar realidades que não eram tão sufocantes, pude interagir com pessoas com mais empatia e com as quais pude trocar e compartilhar experiências e acredito que isso seja muito poderoso. Saí da faculdade de medicina oficialmente dia três de Fevereiro de 2020! Hoje estudo cinema e audiovisual e trabalho como fotógrafa freelancer.
TP Qual sua experiência favorita como fotógrafa até hoje?
D: Essa é uma pergunta muito difícil para que eu responda, pois já trabalhei com várias pessoas talentosas e queridas! Mas um ensaio pessoal que fiz com uma amiga é, no momento, o que está mais próximo do meu coração, foi um dos primeiros ensaios que fotografia e o meu primeiro trabalho que fez com que me sentisse que estava traçando meu caminho como deveria. Aqui estão algumas fotografias.



TP: Quando você se vê precisando de inspiração, para onde ou quem você procura?
D: Quando estou criando um conceito sozinha busco em minhas experiências pessoais e realidades pelas quais navego e reflito a respeito do que sou capaz de criar a partir daí, assim como o que eu gostaria de ver em meu trabalho. Quando estou trabalhando com outras pessoas, meu foco é fundir nossas visões e mesclá-las da forma mais intensa possível para criarmos algo que nos represente. Posso criar e complementar uma ideia por dias e até meses e quando tenho a oportunidade de trabalhar no meu tempo, o que acontece especialmente em projetos solo, sinto que o trabalho se torna mais incorporado e traduz melhor o que estou tentando dizer.
TP: Se você pudesse dedicar sua arte a alguém, quem seria e por quê?
D: Para mim, entendo que a estrada que caminhei para estar onde estou hoje não foi fácil e para ter a força para encarar desafios futuros preciso acreditar em mim e na mensagem que quero passar. Sou minha crítica mais cruel, porque estou criando algo que vai ultrapassar meu tempo de existir e desejo que pessoas que não se encaixam em ideais patriarcais, heterossexistas e transfóbicos possam se ver representadas no meu trabalho. Minha arte mudou minha vida para melhor e se puder ter um impacto positivo na vida de outras pessoas eu gostaria que soubessem que também dedico a elas.
TP: Você pode compartilhar sua Polaroid favorita criada por você?
D: Minha Polaroid favorita foi tirada no carnaval desse ano, eu e meus amigos nos encontramos nas casas uns dos outros antes dos blocos e fazemos nossa própria festa.

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